quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

As Cavalhadas de Vil Moinhos


Cavalhadas

                  Vil Moinhos é uma pitoresca povoação junto a Viseu. A sua forte ligação com moinhos e moleiros explicam o nome adotado, o qual derivou de Villa de Molinis. Os moleiros de Vil de Moinhos trabalham o cereal até chegar ao resultado de farinha, a qual é posteriormente trabalhada pelas habilidosas padeiras, estando na base da famosa produção de broa fina, a qual era vendida no mercado. Segundo a história contada pelos velhos moleiros, o rio Pavia era disputado pelos lavradores e pelos moleiros, os primeiros para regarem as hortas, os segundos para as mós. Para que perpetuassem as águas do rio, os moleiros estabeleceram um voto perpétuo a São João Batista, recorrendo o rio Pavia, “vencendo” a disputa contra os lavradores, prometendo uma romaria anual à capela de São João, a 24 de Junho. Em 1652, segundo conta a tradição foi iniciada a romaria à capela, provando a vitória dos moleiros. O cortejo da romaria é bastante variado, sendo os mordomos e os moleiros os principais intervenientes. O cortejo de moleiros chegou a incluir mais de cem cavaleiros, trajados a rigor, como da nobreza se tratasse. Segundo as normas do cortejo, na frente seguem os três mordomos e o alferes, o qual é o transportador oficial da bandeira dos moleiros, os quais eram seguidos pelos moleiros, também eles a cavalo. Deste modo, todos seguiam no cortejo até ao local do cumprimento do voto.
                  Atualmente, o cortejo está um pouco alterado, mas a génese geral, manteve-se. Os carros alegóricos que alegram a romaria foram introduzidos posteriormente, mantendo-se os mordomos, o alferes e centenas de homens lembrando os velhos moleiros. Foram introduzidos os Zés-Pereiras[1] (grupo criado especialmente para o dia das Cavalhadas) que animam o corso, bem como os Gigantones[2], caricaturando e animando a população. Os carros alegóricos são muito importantes, pois são eles que vão oferecendo alguma dinâmica ao corso, introduzindo temáticas mais contemporâneas e relembrando outras clássicas, não descurando as atividades tradicionais, como a serração manual de madeira, celebração do amor, entre outros. O início do cortejo dá-se pela manhã do dia 24 de Junho, reunindo todos os intervenientes no largo da povoação, percorrendo de seguida as principais ruas de Viseu, em direção à capela, regressando depois a Vil de Moinhos. Os carros alegóricos normalmente não vão até a capela, pois as grandes dimensões impedem-nos de prosseguir pelas apertadas ruas e travessas, seguindo somente os mordomos, em jeito de cumprir o voto histórico. Este cortejo tradicional transformou-se num importante evento turístico, convidando imensa gente de todo o país a visitar Viseu.


[1] Os grupos chamados "Zés-Pereiras" são característicos das festas e romarias do Norte de Portugal com maior incidência para o Entre Douro e Minho. Estes grupos desfilam pelas ruas tocando instrumentos de percussão - caixas de rufo, timbalões e bombos; assim como aerofones melódicos: pífaros e gaitas-de-foles. Recentemente a concertina, instrumento de grande expressão no Minho, tem sido introduzida nestes conjuntos.

[2] O gigantone é um boneco de figura humana com 3,5 a 4 metros de altura, típico das festas populares portuguesas, romarias e cortejos de carnaval. O boneco tem uma estrutura que permite ser “vestido” e é inclusivamente manuseado por uma pessoa no seu interior. A cabeça de grandes dimensões é concebida em pasta de papel, e o resto da estrutura pode atingir trinta quilos, peso suportado pelos ombros do manuseador e que faz com que a amplitude de movimentos do boneco seja limitada. Os gigantones não aparecem sozinhos, mas em par ou grupos de casais, envergando trajes de cerimónia ou populares, e desfilando ao ritmo de música tocada por zés-pereiras. Podem ser acompanhados por cabeçudos, bonecos mais pequenos (tamanho de uma pessoa) com uma cabeça enorme e desproporcional relativamente ao corpo. A cabeça, também feita em pasta de papel, é usada como uma espécie de capacete, e as roupas são mais informais e coloridas que as dos gigantones, podendo mesmo personificar monstros ou demónios. Com maior liberdade de movimentos que os gigantones, os cabeçudos dançam e movimentam-se alegremente como um rancho de filhos ou uma corte animada ao seu redor. No Minho também são conhecidos por almajonas. Pensa-se que o primeiro gigantone data de 1265, aquando da Procissão do Corpo de Deus, em Évora. A representação simbólica representa a serpente, o demónio e o dragão, os sacramentos que Jesus tinha vencido. Existem imensas referências que registam a sua aparição também no Norte do país, notando erroneamente que a introdução do gigantone veio da Galiza nos finais do século XIX.

Vinho do Porto


Vinho do Porto

Natural e fortificado, o vinho do Porto é um tipo de vinho específico da região demarcada do Douro. Régua e Pinhão são os principais centros de produção deste néctar. A história do vinho é bastante antiga, pensa-se que na época dos Descobrimentos Marítimos já se produzia, mas em menor quantidade. Por outro lado, existem alguns historiadores que declaram que o vinho do Porto é originário dos ideais ingleses, pois durante o século XVII começou a ser exportado para todo o mundo. Desta maneira, os ingleses adicionavam brandy, de maneira a que não azedasse (Sellers, 1899).
                  Reza a lenda que o aparecimento do vinho do Porto aconteceu há muitos séculos, mas como o conhecemos hoje, só surgiu por volta do século XVII. Em 1386, o Tratado de Windsor veio estabelecer uma forte aliança entre Portugal e Inglaterra, fomentando a comercialização dos produtos de ambos os países. Durante o século XV, a exportação do vinho era feita, muitas vezes, em troca do famoso bacalhau. Mais tarde, o tratado comercial anglo-português de 1654 criou um novo leque de oportunidades para os ingleses e escoceses que viviam em Portugal, fornecendo-lhes privilégios. O centro vinhateiro a Norte de Portugal não era o Porto, mas sim Viana do Castelo, pois tinha um bom porto natural no Rio Lima. As trocas comerciais que se davam através deste porto era a exportação de cereais, fruta, azeite e vinho (“red Portugal”) e importava-se lã e tecidos de algodão da Inglaterra. Em 1667, Colbert implementou uma série de medidas que impediam a importação de bens de Inglaterra para França. Desta maneira, Charles II de Inglaterra aumentou o imposto sobre os vinhos franceses, acabando por proibir a sua importação. Foi a partir daqui (1667) que o vinho do Porto se exportou mais e mais. Os ingleses que residiam em Portugal sabiam que o vinho do Porto não era muito apreciado pelos ingleses, então decidiram ir mais para o interior de Portugal, procurar vinho mais forte, encorpado – Alto Douro. É desta região que é hoje produzido o vinho do Porto. Assim, o vinho circulava da região do Alto Douro até ao Porto, por meio de barcos pelo Rio Douro abaixo, chegando sim à porta da exportação. Peter Bearsley[1] foi um dos primeiros comerciantes de vinho do Porto a fixar-se no Porto, antes residindo em Viana do Castelo. Pensa-se ainda que a primeira exportação do vinho do Porto ocorreu em 1678. De maneira a aguentar a longa viagem, era adicionada aguardente vínica, aumentando a sua força alcoólica, impedindo o azedamento. Esta técnica não pode ser confundida com a adição de aguardente durante o processo de fermentação, pois só durante a fermentação é que adotada o sabor característico. Em 1703, o Tratado de Methuen entre Portugal e Inglaterra veio ainda fortalecer mais a relação comercial existente. O “vinho do Porto” era agora mais ao gosto do consumidor inglês do que o “tinto de Portugal” do Minho. Na segunda metade do século XVIII houve uma nova expansão do vinho mas, desta vez, já fortificado durante o processo de produção, tal como hoje conhecemos, acabando em 1850 por ser totalmente fortificado durante a produção. Forrester foi um barão que sempre se opôs à fortificação do vinho do Porto. Em 1887, a criação da linha de caminhos de ferro foi uma mais valia para o transporte do vinho, pois os rabelos eram menos estáveis e mais demorados. As garrafas de início do século XVIII eram bulbosas, de base larga e pescoço curto. A ideia inicial era que o vinho fosse bebido diretamente da pipa, sendo transportado nesta garrafa com as iniciais do seu proprietário. Com o advento do Vidro, as garrafas começaram a ser produzidas, de maneira a poderem ser guardadas na horizontal, coisa que não acontecia com as pioneiras (História do Vinho do Porto, 2011).

Existem três tipos de Vinho do Porto: Branco, Ruby e Tawny, dependendo, claro está, da casta que é utilizada. O Porto Branco é produzido num processo distinto, pois as castas não entram em contacto com o mosto na fase de fermentação e envelhece em balseiros de 20 mil litros. Tendo um sabor jovem e frutado, o Porto Branco é caraterizado pela sua doçura. Ainda dentro desta categoria, pode-se ainda destacar o Branco Seco, Branco Meio-Seco e Branco Doce, sendo que possuem todos um trave doce, devido ao seu método de produção.
O Porto Ruby é um vinho muito frutado de coloração escura (rubi), devido ao baixo contacto com a madeira, conservando assim as suas características iniciais, devido à baixa oxidação. Com um forte sabor adocicado a frutos vermelhos, principalmente frutos silvestres e ameixas, mas sempre com um cariz jovem, envelhecendo também em balseiros.
Porto Tawny é um vinho tinto, feito das mesmas uvas que o Ruby, mas envelhece em menos tempo do que o Ruby, cerca de dois a três anos nos balseiros. Posteriormente ao envelhecimento nos balseiros, Ruby passa para as pipas de 550m litros, permitindo a entrega à madeira e ao ar. Assim sendo, o Porto Tawny envelhece mais rapidamente do que os outros vinhos Porto, respirando mais e oxidando. Devido à elevada oxidação, o Tawny acaba por perder a cor inicial característica, adquirindo tons âmbar e um sabor a frutos secos. Com o envelhecimento, o Tawny ganha ainda mais complexidade aromática, fortalecendo os característicos sabores iniciais a frutos secos.
Tanto o Branco, como o Ruby ou o Tawny podem ser denominados por Vintage, que é um termo aplicado ao melhor vinho do Porto existente. Só se considera vintage um vinho obtido da colheita somente de um ano, pertencendo assim à classe dos vinhos considerados de qualidade excecional. O seu envelhecimento demora cerca de dois anos em casco, depois envelhecem em garrafa. Assim, recomenda-se que envelheçam três anos, no mínimo, em garrafa (Sellers, 1899).


Fig. – Croft Port Vintage 2000, Vinho do Porto.
http://www.winespiritus.com/743-1160-thickbox/croft-vintage-port-2000-vinho-do-porto-the-fladgate-company.jpg, acedido a 22 de Fevereiro de 2013.

Muitas são as marcas que hoje comercializam este produto, sendo as melhores: Barros Burmester, Calem, Calem “Velhotes”, Croft, Delaforce, Ferreira Fonseca, Kopke, Messias, Cotto, Offley, Ramos, Pinto Romariz, Rozes, Sandeman, Taylors. Vinho do Porto Vintage (Vinho do Porto – 16 Marcas à disposição, 2006).



[1] Peter Bearsley era filho do fundador da Taylor’s, que se diz ter sido o primeiro comerciante inglês do vinho a fazer a perigosa e desconfortável viagem para além do Marão, em busca de melhor vinho.

domingo, 24 de fevereiro de 2013

Joaquim Pedro Quintela, 1º Conde do Farrobo e o seu ilustre palácio em Vila Franca de Xira

“Ali, tudo é ordem e perfeição. Luxo, calma, e sensação.”   
Charles Boudelaire

Com esta investigação pretende-se alertar que existem várias obras arquitectónicas consideradas Imóvel de Interesse Público (IIP), mas que se encontram em avançado estado de degradação. Por outro lado, pretende-se ainda mostrar esta pérola que está perdida no tempo e que necessita de rápida intervenção, caso contrário, perder-se-á. Descobriu-se que existe de facto uma proposta de remodelação do Palácio junto da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, promovendo a construção de um Lar para a Terceira Idade.

O Palácio do Farrobo, atualmente propriedade da Santa Casa da Misericórdia de Vila Franca de Xira, foi edificado na Quinta homónima, que resultou da junção de diversas propriedades rústicas, instituídas em morgadio em 1801, tendo sido Joaquim Pedro Quintela (20.08.1748 – 01.10.1817) o seu primeiro proprietário. Quintela, também conhecido por 1º Barão foi um grande negociante e capitalista, vivia em Lisboa no Palácio Quintela, situado na Rua do Alecrim, em pleno Chiado. A fortuna proveio dos familiares diretos, particularmente de pais, Valério José Duarte Pereira e Ana Joaquina Quintela, e tios; estes detinham contratos comerciais de negócios como: tabaco, diamantes, azeite, peixe e óleo de baleia, fábricas de lanifícios na região de Covilhã e Fundão. 
Teve como esposa D. Maria Joaquina Xavier de Saldanha (10.04.1774), tendo resultado desta união dois filhos: Maria Gertrudes Quintela (28.05.1797 – 08.09.1824) e Joaquim Pedro Quintela (11.12.1801 – 24.09.1869). 
Paralelamente à gestão dos negócios de família, foi responsável pela administração do Teatro Nacional S. Carlos durante alguns anos, enquanto a Corte esteve exilada no Brasil. Tentou também oferecer a melhor formação aos seus filhos. Era um amante de caçadas, particularmente nas Lezírias de Vila Franca de Xira, retinha a ideia que era elegante a caçada a lebre, tanto que trouxe a raça de cães setter para Portugal, de modo a colocar em prática os seus ideais.
Joaquim Pedro Quintela, tinha como título 2º Barão de Quintela, 1º Conde do Farrobo. Desde pequeno que, o seu pai o incentivou a ser músico, pois era amante de Ópera. Os negócios de seu pai atrapalharam a sua educação, porém sempre que podia ia com Joaquim Pedro a espetáculos, à caça. Sua mãe, Dona Maria Joaquina Xavier de Saldanha, era uma mãe dedicada, mas a sua atenção recaía principalmente na sua filha, Maria Gertrudes Quintela. Não existem muitos relatos relacionados com Maria Gertrudes, apenas sabemos que mantinha uma profunda amizade e carinho pelo irmão, normalmente brincavam juntos no palácio das Laranjeiras, apesar de ter mais quatro anos do que Joaquim.
O Conde de Farrobo como era vulgarmente conhecido, destacou-se por ser um apoiante de D. Pedro IV, que o recompensou com o título de Conde de Farrobo (1833) após a vitória liberal. As suas qualidades artísticas e a imensa fortuna que possuía celebrizaram o seu Palácio das Laranjeiras, situado nas Laranjeiras, onde decorreram festas memoráveis e onde existia um teatro, palco de diversas e significativas representações. Para além de muitos outros títulos e funções, o Sr. Conde teve destaque como negociante, pois herdou de seu pai grande parte dos negócios. Com a crise económica, os principais negócios deixados pelo pai começaram a cair, particularmente o do Tabaco e o do Papel. 

Casou-se por duas vezes, sendo o primeiro casamento com D. Mariana Carlota Lodi (03.12.1798 – 23.07.1867), a 19 de Maio de 1819, na Igreja da Encarnação; o mais marcante, pois da união surgirão sete filhos: Maria Joaquina Quintela Farrobo (1819), Maria Carlota Quintela (1821), Maria Madalena Quintela (1822), Joaquim Pedro Quintela, 2º conde de Farrobo(1823), Maria Ana Hortense de Quintela (1825), Maria Palmira Quintela (1826) e Francisco Jaime Quintela, 1º visconde da Charruada (1827). Com Marie Madeleine Pignault (1810), sua segunda esposa, resultaram três filhos: Júlio Maria Quintela (1855 – 24/02/1911) , Maria Joaquina Quintela (1856) e Carlos Pedro Quintela (1866).

A sua Quinta de Vila Franca de Xira funcionava como uma espécie de retiro de lazer, onde o Sr. Conde produzia vinho, organizava caçadas, grandiosas festas, banquetes, convidando a Alta Burguesia e a Nobreza. O palácio foi projectado pelo arquiteto Fortunato Lodi, por volta de 1805, aquando da junção das Quintas em morgadio. O projecto demorou alguns anos a avançar, tanto que foi Joaquim Pedro Quintela, 2º Barão, quem edificou, em 1835, o palácio que hoje conhecemos. 

O imóvel insere-se num terreno rural, desenvolvendo-se o corpo principal em planta rectangular, onde se destacam os volumes dos corpos laterais e central, avançados em relação aos restantes. O edifício é constituído por dois pisos, tendo todo o complexo arquitectónico um ar soberano e altivo. O local escolhido para a edificação do projeto foi o ideal, transmitindo os bosques italianos de que Fortunato Lodi tanto se orgulhava, pois tem muita vegetação envolvente e ao longe avista-se o rio Tejo. A vinha que ainda lá se encontra compunha a composição do jardim, esta iria desembocar nas árvores de fruto que circundam o palácio.
No alçado principal, duas torres flanqueiam um corpo central, mais baixo, de dois andares (como os restantes), precedido por uma escadaria de lanços convergentes, paralelos à fachada. Estes permitem o acesso à loggia do andar nobre. Todo o pano murário é aberto por uma série de vãos simétricos, com janelas no piso térreo e de sacada no andar superior. No alçado posterior é ainda visível o corpo do antigo teatro que também aqui existia, e que deveria ser uma réplica do Teatro Nacional de S. Carlos.

“Estava rodeado quase por todos os lados de vinha. Da parte norte ficava a tapada de caça com os seus altos muros. (...)Talvez a falta de vegetação provocasse esse efeito. O conde mandara plantar palmeiras e árvores de copa, mas ainda não tinham crescido o suficiente, o que as fazia parecer ainda mais pequenas, esmagadas pela grande massa do edifício.”
O portão dava para um pátio amplo, o qual era copiosamente guarnecido por canteiros cheios de flores e pequenos arbustos.
Relativamente ao interior, o palácio foi copiosamente pensado, de maneira a oferecer a maior privacidade e comodidado pois, desde bem cedo que o conde pensou ter em Vila Franca de Xira a sua estância de férias provada.
Lodi dividiu as áreas equivalentes por andares. “No andar térreo há a cozinha e sua casa para as massas; um bela sala de jantar quase quadrada e com sessenta palmos de lado, pintada pelos Senhores Rambois e Cinatti; outra casa de jantar para os creados, quartos para hóspedes, para creados, para a música destes, para engomar, dispensa e mais alguns outros. Seis escadas dão comunicação entre os dois pavimentos.”
O palácio tinha uma dinâmica incrível, as salas cruzam-se com halls, que desembocam noutras salas e as pessoas vão andando sem atropelos. Já no ”andar nobre: sala grande do tamanho da casa de jantar do andar de baixo, outra mais pequena para uso diário, biblioteca com uma boa coleção de obras modernas, sala de bilhar, sala para xadrez e gamão, outra para jogos de cartas dedicada ao Reverendo Padre Castro, escritório particular do conde, quarto para estudo, outro para lições de música, quartos para as filhas de S. Exas., para hóspedes, quarto de cama de S. Exas., com os respectivos para toilettes, e copa e um belíssimo teatro arranjado pelo Sr. Bertrand, antigo maquinista do teatro e também pintado pelos citados pintores.”

O mobiliário utilizado na decoração do palácio era de estilo moderno. A exemplo de outros países, o mobiliário do século XIX não tinha a beleza dos móveis dos séculos anteriores. A peça mais importante de mobiliário português sempre foi a cama, que adquiriu um estilo próprio, um carácter típico do país. Os candeeiros eram lustres, escolhidos em Paris pelo Conde de Viana; luxúria típica da Corte francesa, mostrando bastante bem o exagero e a ostentação desmesurada.

Os seus ilustres convidados vinham de barco e paravam na marina de Vila Franca de Xira, para depois fazerem o percurso até chegar ao palácio. Desde a marina  até ao Palácio que fica perto da localidade de Loja Nova (Quinta da Coutada) o percurso era feito de charrete, pelo actual Estrada de Santa Sofia. O percurso era ardiloso e longo, esburacado e cheio de mato. Sempre que haviam festas, os convidados dormiam no palácio, pois era complicado voltar para a cidade de noite. Costumavam mesmo passar três ou quatro dias no palácio, visto poderem usufruir de todo aquele complexo. 
As caçadas eram das atividades mais praticadas pelo Conde e pelos seus amigos. Pegavam bem cedo e iam para as Lezírias atrás dos coelhos. Os almoços de Verão no pátio, eram também uma prática comum; colocavam um toldo enorme e ali comiam até ao cair da noite.

O edifício foi bastante importante na época, tanto ao nível socioeconómico, como ao nível cultural. Ressalve-se que, a Quinta onde está inscrito o palácio tem uma vinha imensa, a qual fornecia vinho para a zona de Vila Franca, mas também para fora da região. Esta produção de vinho, trazia fundos para o Conde, mas também para o concelho. Numa das torres do palácio havia inclusive um telégrafo de sinais que estava não só em comunicação com os telégrafos nacionais, como podia comunicar com um aparelho portátil que o Conde costumava utilizar, de modo a que lhe transmitissem informações sobre o local dos animais de caça, tanto nas suas propriedades, como nas Lezírias. Ao nível cultural, o Conde trazia companhias de bailado e ópera italianas, Varesi, Fornasari, Spechi, Ferreti, para actuarem no seu teatro particular. Trazia também pessoas a conhecerem Vila Franca, logo era mais um meio de divulgação da vila que, à altura, era bastante movimentada.

Actualmente o edifício encontra-se em avançado estado de degradação, mas sabe-se que todo o interior era profusamente decorado, por quadros, frescos, esculturas. Ao nível de Pintura, sabe-se que existiam alguns quadros do pintor Auguste Roquemont; as salas respiravam um ar romântico, devido aos frescos de Ramboise e Cinatti. Atualmente ainda se pode observar alguns vestígios dos frescos, estando estes bastante danificados, praticamente em ruína. 

Todo o luxo, toda a sumptuosidade caiu por terra quando começaram a falir os contratos do Papel-moeda e do Tabaco. 
O Palácio acabou por ter mais dois proprietários, mas estes também não o conseguiram sustentar. Por volta de 1970, foi doado à Santa Casa da Misericórdia, pois não havia mais nenhum proprietário interessado na compra do mesmo. As ruínas são fruto do tempo e do desinteresse em torná-lo ainda mais um Imóvel de Interesse Público. Com o passar do tempo vai cair no esquecimento se assim continuar a sua deterioração.

Bibliografia


NORONHA, Eduardo, O Conde de Farrobo – Memórias da sua vida e do seu tempo, Lisboa, Romano Torres, 1945.
NORTON, José - O Milionário de Lisboa, Livros d’Hoje, 2009.

NUNES, Graça Soares - Vila Franca de Xira - Economia e Sociedade na Instalação do Liberalismo (1820-1850), Edições Colibri / Museu Municipal - Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, Dezembro 2006

“O Conde do Farrobo”, Jornal Vida Ribatejana. Vila Franca de Xira: 1936, 1677.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

Dia dos Namorados


O Dia dos namorados é, mais uma vez, uma lenda bíblica com poucas fontes literárias que comprovem a sua veracidade, mas também uma lenda que, de alguma maneira, tem sido adaptada, tornando-se aquilo que é hoje. Segundo a Literatura Católica, durante o império de Cláudio II, este tinha de reunir imensos rapazes, garantindo a conquista do mundo, formando o “império romano mundial”. Certo é que, o imperador, ao pensar que o casamento desviava os jovens de seguirem a carreira militar, proibiu a realização de casamentos, tornando os jovens militares e seguindo os seus ideais de conquista mundial. Para contrariar toda esta visão imperial, um bispo denominado Valentim continuou a realizar casamentos, mas à “socapa”, pois tinham sido proibidos. Ao descobrir, Cláudio II mandou prender o bispo romano, mas muitos eram os que iam visitá-lo, de maneira a casarem-se. Astérias, uma jovem invisual, foi também ter com o bispo Valentim, e logo se apaixonaram.Conta o Evangelho que Astérias deixou de ser invisual, miraculosamente. Aos 14 dias de Fevereiro de 270 d.C. Valentim foi decapitado, celebrando-se assim a Festa de São Valentim neste dia de comemoração da sua morte.


São Valentim

Nesta imagem representa-se o S. Valentim, abençoando duas entidades femininas, uma porta uma venda, remetendo para Astérias e a outra entidade, com um filho no regaço, deverá ser uma qualquer rapariga que buscava auxilio em São Valentim. A representação simbólica da folha de palma ou palmeira, remete-nos imediatamente para os santos martírios, sendo o símbolos dos mártires. O panejamento que o cobre tem claramente forma de túnica bispal, bem como as colorações utilizadas na época, cor púrpura, obtida através dos moluscos marítimos.

Cupido

Paralelamente à história bíblica de São Valentim, existe a mitológica de Cúpido, que era considerado o deus do amor. Seus pais, Marte (deus da Guerra) e Vénus (deusa do Amor e da Beleza) foram ordenados por Júpiter (rei dos Deuses) a abandoná-lo, mas Vénus não permitiu e escondeu-o nos bosques, nos quais Cupido se alimentou de animais selvagens para sobreviver. Júpiter desde cedo percebeu que Cupido seria um perigo para o mundo.

Vénus e Cupido

Um dia, a deusa Vénus avistou do alto dos céus uma jovem muito bonita chamada Psique, chamou Mercúrio e pediu para lhe entregar uma carta. Psique nunca tivera recebido uma carta entregue por um deus, mas ficou triste ao lê-la, pois Vénus declarou que Psique iria casar com a criatura mais horrenda. Desesperada foi contar às suas irmãs, mas estas, tal como a deusa Vénus, morriam de inveja dela.
Paralelamente a tudo isto, Vénus chamou o seu filho ao monte Olimpo e pediu para que atirasse uma flecha de amor a Psique, fazendo com que se casasse com o homem mais feio do planeta. Cupido obedeceu prontamente, pois respeitava a sua progenitora e não querendo contrariá-la foi atrás de Psique. De noite, entrando pela janela de seu quarto, avistou os seus traços majestosos, limpos, belos, e quando se preparava para acertar, Psique move o braço e Cupido acerta nele próprio, ficando perdido de amores pela jovem.
Pouco tempo depois, Cupido pediu a Zéfiro (vento oeste) que transportasse Psique para o seu palácio. Ao cair da noite, Cupido foi visitá-la e explicou-lhe o que acontecera e viveram felizes, mas Cupido falava com Psique em formato invisível, deixando-a curiosa da sua verdadeira identidade. Uma noite enquanto dormiam juntos, Cupido apareceu em formato “normal” e Psique curiosa, pegou numa lamparina e foi vê-lo enquanto dormia. Cabelos louros, rosetas coradas, mas descuidou-se e entornou óleo no braço de Cupido. Assustado desapareceu para sempre e Psique ficou sozinha num local deserto. Desesperado com o sucedido, Cupido pediu a Júpiter para repôr toda a história, mas este não acedeu aos seus pedidos, pois um deus não poderia viver com uma mortal. Contestando, Cupido pediu para que Júpiter tornasse Psique imortal, tornando-se a deusa da Alma. Casaram-se com o apoio de toda a comunidade mitológica, musas, graças e até a sua mãe Vénus.

Cupido e Psique

Atualmente o Dia dos Namorados recupera um pouco destes mitos e lendas, tanto mitológicas, como as religiosas, com acesso às imagens de S. Valentim, mas mais fortemente ao famoso Cupido, que foi brutalmente caricaturizado, tornando-se no ícone do Dia dos Namorados. Com ar maroto, normalmente é representando com um arcás e várias flechas, não descurando o ar divinal e frágil, em simultâneo. Não podemos ainda esquecer o conteúdo teórico destas famosas histórias, pois acima de tudo são maneiras para tornar o mundo melhor, as quais são exemplificadas por entidades divinas que, ao ver do humano comum, são as únicas entidades que podem atingir a perfeição.