domingo, 18 de janeiro de 2015

Feira do Melão & Salão do Cavalo

Este meu texto já convive comigo - na cabeça - há uns anos, mas tem sido um dequite difícil. Gosto muito da minha terra, mas cada vez vejo menos a sua identidade, vejo governantes virados para questões sem pertinência alguma, discutindo o , enquanto que as nossas tradições se vão desvanecendo dia após dia, ano após ano, principalmente junto das camadas mais jovens.

Lembro-me de ser uma criança muito “viajada”, mas cada vez que ia à “vila” (termo que ainda é utilizado hoje para designar Vila Franca de Xira) era uma excitação, havia muita gente na rua, festas, romarias, atividades para os mais jovens. Hoje vou abordar duas Festas que penso que eram  importantes para a economia local e obviamente para o concelho: a Feira do Melão e o Salão do Cavalo.

A Feira do Melão surgiu em 1980 na tentativa de lançar os produtos provenientes das Lezírias, escoando stocks, a preços competitivos. Quem esteve à frente do certame foi o Sr. Abel Arrenzeiro Pereira (Alpiarça), o Dr. Álvaro Diniz e a Dra. Magda Leite Velho. A feira decorria normalmente no jardim Municipal Constantino Palha e era um fim-de-semana bem animado, com grupos de cantares populares, ranchos folclóricos, variadas atividades, com ligação direta à vida rural ribatejana.
O certame terminou em 2006 com os argumentos:

  • invasão do melão maioritariamente espanhol no mercado português;
  • crescentes custos de produção;
  • falta de incentivos que afastam produtores do cultivo nas Lezírias.

É de facto muito mais simples acabar com uma feira/atividade do que perceber o que está errado para depois relançar essa mesma feira. Caros, penso que esta questão nem sequer foi levantada, mas porque é que a Feira do Melão acabou?
Numa vertente contemporânea, penso que mais do que grandes bibliotecas, grandes museus de arte contemporânea, Vila Franca os vilafranquenses e ribatejanos precisam de reviver as suas origens, a sua identidade e é com este tipo de certames que isso acontece, é nestes momentos ditos populares que o português aplaude de pé.
Apresento abaixo algumas soluções para a revitalização da Feira do Melão:
  • introduzir outros produtos provenientes das Lezírias, para além do melão;
  • atualizar o certame, tentando captar outro tipo de público, como empresas, investidores;
  • efetuar passeios no Barco Varino Liberdade e outros durante o certame;
  • preservar a identidade cultural da região, bem como os produtos e artefactos;
  • tirar partido da excelente revitalização do Jardim Constantino Palha, dinamizando toda a cidade.

Salão do Cavalo

O Salão do Cavalo em Vila Franca de Xira era um certame dedicado ao cavalo, principalmente Lusitano e à Companhia das Lezírias. Sabe-se que a região de Vila Franca tem fortes ligações ao campo, à Festa Brava e, por isso, ao cavalo. O certame foi iniciado no final da década de 80, particularmente em 1989, tendo sido fortemente apoiado pelo Eng. Sommer d'Andrade, o Dr. Torcato de Freitas, José Assis Pereira Palha, Major Simões Pereira, Coronel Cabedo entre outros elementos que faziam parte da comissão organizadora. Acontecia tipicamente no primeiro fim-de-semana do mês de Maio, no local que hoje conhecemos como Campo do Cevadeiro, junto à entrada sul da cidade. Era nesse campo que vinham de todo o país cavaleiros, marialvas, e entusiastas curiosos espreitar os místicos de quatro patas. Era uma regressão ao passado com pompa e circunstância, desde os trajes típicos aos passos equestres que se vislumbravam às pargas, não só no local da feira, mas por toda a cidade.
Não só era um desfile de cultura, havia também um conjunto de provas equestres que, nalguns casos, pontuavam para o campeonato nacional. Modalidades como o Horseball, Equitação de Trabalho, Condução de cabrestos, Picaria à vara larga, Concurso do Poldro mamão, eram alguns dos momentos do certame. Normalmente acontecia também um show equestre protagonizado pelo Centro Equestre da Lezíria Grande, se a memória não me trai.
Paralelamente a este conjunto de atividades, existia também o comércio de cavalos.
Todos ganhavam com estes certame, desde cafés, restaurantes, hotéis; a própria cidade tinha outro espírito nestes dias de festa, tal como acontece na Golegã, durante a Feira de S. Martinho, mas em ponto pequeno.
Em 2003, o certame terminou no dito Campo do Cevadeiro.
Entre 2004 e 2010 a festa teve lugar no Cabo das Lezírias de Vila Franca de Xira, tendo sido catapultada do centro da cidade, para uma zona inóspita. Foi uma decisão profundamente contraditória, pois alguns pensaram que ia ser um grande input para a festa, aproxima-la do campo, outros afirmavam que a festa ia durar pouco mais. Ao ser realocada no Cabo das Lezírias, a festa perdeu muita da sua magnificência. Apesar de terem sido feitos esforços para levar até lá pessoas, acontece que a festa perdeu público, perdeu visibilidade, identidade.

Porque será que terminou este certame? É uma questão que se levanta, mas que aparentemente não há resposta direta, depois de termos dissertado sobre algumas vantagens que esta festa trazia a Vila Franca de Xira. Será que foi repensado o valor que um certame desta natureza representa ao nível nacional?

Apresento alguns pontos positivos:
  • manter viva a tradição ribatejana;
  • manter viva a tradição equestre portuguesa;
  • revitalizar a cidade;
  • movimentação e fluxo de comércio, sejam restaurantes, hotéis, pensões.
Pontos a melhorar:

  • manter as raízes do certame tradicional, mas fazer ligeiras atualizações, como por exemplo, trazer a festa novamente para a cidade;
  • promover o cavalo na região, para tal, instalar um picadeiro/hipódromo em Vila Franca, de maneira a que os cavaleiros da região tenham um local onde possam treinar os seus equídeos gratuitamente, tal como acontece na Golegã (manga);
  • criar parcerias com Escolas e Companhias Agrícolas para patrocinarem o certame;
  • criar estruturas para que a festa não se desvaneça no tempo;
  • apelar a que as tertúlias tauromáquicas não só colaborem na Festa do Colete Encarnado, mas que apoiem e disseminem a Festa dos Cavalos.
As nossas tradições são a nossa identidade, são elas que nos conferem o carácter distinto dos outros povos, não os deixemos perecer.

André Lopes Cardoso